“American Gods” é a nova série do canal Starz, que é transmitida aqui no Brasil pelo serviço de streaming Amazon Prime Video (pois é, existem outros além da Netflix e com séries incríveis! Só aparecem mais gastos, @Deus –‘).
A série é baseada no livro homônimo de Neil “Que Homem” Gaiman, e criada por Michael Green e Bryan Fuller. Fuller é conhecido em seus trabalhos por ser bem diferentão na estética de suas séries – vide “Hannibal”, que foi super elogiada por seu visual inovador e revolucionário no mundo das séries.
Ou seja, ele é o bichão mesmo.

Com “American Gods”, Fuller não fez diferente: ele usa e abusa de recursos estéticos para contar a história de Neil Gaiman. Na trama, Shadow Moon (Ricky Whittle, “The 100″) é liberado da prisão dias antes de completar sua sentença, devido à morte de sua esposa em um acidente de carro. Transtornado e com esperanças de ter a vida que esperava fora do cárcere, Shadow é contratado por Mr. Wednesday (Ian McShane) e, praticamente, cai de paraquedas em uma guerra entre divindades antigas e novas que coexistem em uma América antes invisível para Shadow.

Os livros de Neil Gaiman nunca foram material de fácil adaptação, mas os produtores acertaram o tom exato do livro, e mais: conseguiram transpor, com a loucura visual de Fuller, toda a confusão encarada por Shadow em seu contato com o mundo dos deuses. Os recursos visuais já dizem a que vieram logo na abertura, lotada de sintetizadores e luzes neon, somadas a totens mitológicos e religiosos (PAVÔNICO!). O piloto sofreu críticas por ser lento e muito confuso (o que realmente é), mas ganha um fôlego surpreendente já em seu segundo episódio, que não só alavanca o ritmo da história como tem uma cena marcante de abertura: o deus “Anansi” em um navio negreiro, trazido com as preces e a fé dos escravos, incita a revolta dos negros para a destruição do navio. Cena para entrar na história da história das séries!

Outro destaque da série é a riqueza de construção dos personagens secundários, presente já no piloto. Pablo Schreiber (ator que já encarnou personagens icônicos nesse mundo das séries, como o Pornstache, de “Orange Is The New Black” e Nick, em “The Wire”) está caminhando novamente para eternizar mais um personagem, o Mad Sweeney, uma divindade de ascendência irlandesa, que carrega todos os estereótipos do país consigo. E o que falar de Laura Moon? A esposa de Shadow (sim! ela volta!), interpretada por Emily Browning, dá vida a uma personagem muito complexa e que tem que lidar com algumas mazelas, como estar morta e se decompondo aos poucos (não tão caricato quanto representado em “Santa Clarita Diet”, mas, mesmo assim, gerando algumas cenas bizarras à narrativa).
“American Gods” utiliza certos recursos como apresentação de cada episódio – onde ocorre uma viagem no tempo – ou um acontecimento isolado, onde os Deuses antigos são o foco da história, para ilustrar melhor como funciona a vida das divindades já esquecidas e que foram trazidas à América (quase que a contragosto) por imigrantes e suas crenças – algo muito parecido com o utilizado no começo de cada capítulo do livro de Gaiman. Essas passagens, ao longo de dois, três episódios, vão desfazendo a confusão de início que muitos espectadores que não estavam acostumados com a história enfrentaram, assistindo aos primeiros episódios (sendo justamente esse o ponto genial da série: Deuses vivendo entre nós e não estão nada bem com esta situação).
Enquanto que alguns Deuses encontram na prostituição sua única alternativa de vida e de encontrar algum tipo de adoração, como a deusa Bilquis (Yetide Badaki), ou, até mesmo, conseguem associar suas funções do universo mitológico ao espectro humano, como bem faz o antigo deus da morte, Czernobog (Peter Stormare), trabalhando em um matadouro de animais, de resto – e para a maioria deles – a vida não está fácil. Do outro lado da pirâmide, temos os novos Deuses, nascidos da adoração dos tempos modernos (como os deuses da Mídia tecnológica e os relacionados a outros aspectos aos quais devotamos tempo e adoração) em estado de graça, sendo eles poderosos!
Se isso é estar na pior, o que quer dizer estar bem né?!
Esses novos Deuses são personificados em figuras bem conhecidas da maioria dos telespectadores – como, por exemplo, uma deusa da mídia, que aparece na figura de um seriado mega antigo e clássico americano, “I Love Lucy”(com pitadas de Marilyn Monroe), um Deus andrógino, que faz referência a David Bowie e seu ‘Ziggy Stardust’, e um deus chamado Mr. World, que parece ter saído de um filme de máfia à la anos 30.
Tenho certeza de que, se esses deuses fossem brasileiros, teríamos o Faustão e o cara da Tekpix nesse panteão!
Com tudo devidamente explicado e deixando o público mais familiarizado com a mitologia da série – que nada mais é do que uma grande mistureba de crenças e culturas diferentes entre si -, a trama começa a caminhar para o desenvolvimento de sua história, que é a Grande Guerra, ou como a música de Bob Dylan no segundo episódio metaforiza muito bem, “A Hard Rain’s A-Gonna Fall”. E é nesse ponto que vi surgirem outras críticas ao ritmo do enredo (muitas vezes associadas à reclamação de que, ao longo da temporada, não houve grande avanço na história).

Realmente os redatores não foram tão longe em questões de acontecimentos marcantes até o final da temporada, mas foi uma first season bastante eficaz para seus propósitos de introdução, onde os produtores focaram em enquadrar o universo complicado de Gaiman à televisão, dando maior ênfase à apresentação dos Deuses, enquanto que o grande plot fica a cargo do recrutamento dos mesmos por Mr. Wednesday ao longo do país para a Grande Guerra.
A série funciona, na maior parte dos episódios, como um grande Road Movie, o que é muito legal!

Outro cuidado dos produtores foi a inserção de dicas durante os episódios para que os mais atentos ou entendidos de mitologia já saquem o final da temporada, como nomes menos conhecidos dos Deuses, elementos visuais que fazem parte da mitologia de um ou outro Deus mais importante na história e outras pontinhas que não serão citadas, por motivos de Não Quero Dar Spoiler (Shhhh).
Mas são essas dicas que fazem com que a grande revelação da series finale possa gerar esses dois tipos de reações nos espectadores:


A série, atualmente, está em sua primeira temporada e é bem curtinha, total de oito episódios, valendo muito a pena ser assistida – tanto por ser esteticamente muito diferente do que vem sendo produzido na TV, quanto pela sua narrativa, que se utiliza de metáforas de Deuses para discutir a nossa paixão e devoção por tecnologias, confortos do mundo moderno e, principalmente, do vazio e da luta que é sobreviver na América.
Espero que tenham gostado do post e até mais, pessoal <3